domingo, 4 de março de 2012

Kerubiel: um anjo de vinho mexicano

Em 2007, estive várias vezes no México a trabalho. Cheguei a passar 3 meses por lá (voltava alguns fins de semana) e pude conhecer muito da cultura mexicana, consequentemente dos seus vinhos. Aliás foi até divertido como fui apresentado aos vinhos mexicanos. Conversando sobre vinhos com um colega de trabalho, o Paco (óbvio, só poderia ser o Paco), ele me fez a pergunta: "Le gusta el vino mexicano?"... o que responder? Não tinha a mínima ideia de que o México produzia vinhos... então disse "Hay vinos mexicanos?". O Paco não ficou muito feliz, fez uma cara.... e para me provar que havia bons vinhos por lá, me pagou o jantar com vinho mexicano em um dos belos restaurantes do bairro Santa Fé!!



Um aparte: não sofri o tal mal de Montezuma como é comum aos iniciantes na comida mexicana, mas não sou um apaixonado por ela. Sempre adicionava ao meu pedido "sin picante". Mas saindo das pimentas e do maiz, há algo interessante na culinária mexicana. Lembro de um bar/restaurante com comidas ligadas às coisas do mar que, entre outros itens, oferecia um caldo de frutos do mar que bebíamos em copo (o suadouro já começava ali), e não em um prato ou cumbuca comendo com colher o que seria normal para um caldo. Também pedia sempre um polvo grelhado, de apresentação muito simples: sem a cabeça com os tentáculos chamuscados pelo calor da brasa da grelha!! Ficava meio sêco, mas eu adoro polvo.... 


Voltando aos vinhos mexicanos, tive então a oportunidade de perguntar ao meu amigo Paco: "Le gusta el vino brasileño?"... de pronto respondeu "Hay vinhos brasileños?"... Como naquela época, eu vivia somente em aeroportos, acabei comprando uma garrafa de Lidio Carrara, sempre presente nas prateleiras da loja do free shopping na saída do Brasil, para presenteá-lo.


Não lembro do vinho que tomamos naquele jantar, nem do nome do restaurante. Lembro que era "una tienda de vinos con mesas para comer", que provavelmente já deve ter mudado para "un restaurante com venta de vinos" pois o local já tinha muitas mesas, todas cheias, fora a espera. As prateleiras dos vinhos formavam todas as paredes do restaurante, inclusive servindo para separar ambientes. Um maná para nós apreciadores de vinho.


De qualquer forma, ficou a marca em mim de que havia vinhos mexicanos sim e alguns bem interessantes. Já tomei alguns mexicanos depois disso, lembro principalmente do Vino de Piedra 2007 - Ensenada, bem apreciado por lá, um excelente vinho.


Gostaria de compartilhar este último que tomei:
Kerubiel Adobe Guadalupe 2007


Adobe Guadalupe Vineyards and Inn: um local realmente para o prazer -> uma vinícola e um haras com um bed&breakfast.... Veja este vídeo de apresentação:



A música é envolvente, uma mistura de cigana e mexicana, que mostra toda a latinidade hispânica desta vinícola. A casa com o passeio central e seu chafariz me transportou para um México romântico e conquistador. E os nomes de seus vinhos não poderia exprimir melhor a cultura católica e a religiosidade fortemente incutida naquele povo.

O local parece harmonioso, as parreiras, os cachos, os trabalhadores, o trato das uvas, com anjos espalhados por todo o canto, anjos que dão nomes aos vinhos. Até as luminárias e adereços dos muros tem asas que nos lembram os seres angelicais. Por fim, não poderia faltar a Virgem de Guadalupe, a padroeira das Américas.

E dentro deste espírito religioso foi criada esta vinícola, a partir da visão da matriarca da família em uma visita a igreja de Notre Dame em Paris. Esta história não poderia ser mais mexicana, não?!

A vinícola tem como filosofia a harmonia com a natureza e a experiência única com seu vinho. Por isso, fazem vinhos multivarietais, no estilo do Vale do Ródano - França. Vejam a influência do novo mundo, principalmente da indústria vinicola da California, nesta declaração: a experiência única tem como um dos principais fatores o vinho de corte, tão comum no velho mundo.

Nem preciso dizer q este vinho, o Kerubiel, é celestial:
Castas: 31% Cinsault, 29% Syrah, 29% Mourverdre, 6% Grenache, 5% Viognier
Alcool: 13.8 %
12 meses en barrica

Coloração Rubi brilhante, mostrando boa vivacidade mesmo depois de 5 anos.
Ao nariz, não muito potente, mas com boa complexidade, aromático, madeira bem integrada, frutas vermelhas, perfume floral, couro e defumado. Conforme o tempo no copo, os aromas iam se abrindo.
Na boca, corpo médio, boa acidez, taninos redondos, um amargor agradável.
É um corte do sul do Vale do Ródano, e as impressões na degustação foram muito próximas das características dos vinhos daquela região.

Uma pena que os vinhos mexicanos são caros, mesmo lá no México. É uma barreira para o desenvolvimento da vitivinicultura mexicana, realmente uma pena pois este vinho é mais um exemplo da boa qualidade da produção vinícola daquele país.